Camila Sá: “O racismo não vai simplesmente sumir se a gente não falar dele”

Conversamos com a jornalista Camila Sá, que tem experiência em parceria de conteúdo, onde busca unir marcas, emissoras, editores e produtores para criação audiovisual original em plataformas de mídias. Ela passou por diversos portais de entretenimento, produziu e roteirizou projetos de marca. Sempre atuando com o recorte de raça e sentindo a necessidade de ter outras pessoas iguais a ela nos locais de trabalho, Camila sempre buscou ampliar o debate de raça, por isso no BuzzFeed foi uma das cocriadores do BuzzFeed Vozes. Hoje ela ocupa o cargo de gerente criativa da Warner Bros. Confira o nosso papo:

Você foi uma das criadoras do projeto BuzzFeed Vozes, que tinha como objetivo fomentar o debate sobre raça no BuzzFeed. Temos visto o surgimento de muitos projetos nos últimos anos nesse sentido. Como você vê esse debate sobre raça crescendo na internet tanto com projetos independentes como nos grandes conglomerados de mídia no mercado de audiovisual?

É fundamental ver essa conversa crescendo e ocupando espaços, é apenas falando sobre diversidade e inclusão e, de fato, praticando que a gente vai conseguir mudar as coisas ao nosso redor. Mas é importante ressaltar que por mais que estejamos avançando, essas conversas ainda estão atrasadas quando paramos para pensar que a comunicação brasileira ainda é predominantemente branca.

Nosso trabalho — e digo nosso porque, embora o racismo seja uma questão que pessoas brancas precisam se responsabilizar, no fim do dia somos nós (pretos, amarelos, indígenas, etc) que mais nos importamos em ver pessoas iguais a nós dentro dos espaços e somos majoritariamente quem luta para isso acontecer — é continuar abrindo oportunidades e devolver pra comunidade o que pudermos.

Alguns movimentos no setor de audiovisual buscam ampliar a presença de profissionais negros na frente e atrás das câmeras, como forma de reparar uma subrepresentação histórica do povo preto nas telas. Ainda assim, é um campo de trabalho majoritariamente branco, sobretudo em funções de liderança como diretores e roteiristas. É possível imaginar que em breve teremos uma mudança nessa realidade e com isso, teremos mais produções que reproduzam a cultura negra nas telas?

Sendo bem honesta, acredito ser possível sim mas, infelizmente, ainda vejo isso longe do ideal. Eu mesma tento, por muitas vezes, furar essa bolha dentro do audiovisual mas há resistência, muito mais no sentido de pensar mais fora da bolha dos profissionais que se conhecem – e que geralmente têm todos os mesmo background e cor de pele – e convidar novos profissionais, se esforçar para pensar em ter outras cores e orientações sexuais nos trabalhos.

Como falei, apesar do racismo ser um problema de pessoas brancas, sem a nossa movimentação as estruturas permanecem como estão. Essa deveria ser uma preocupação de todos, mas, sendo bem sincera, ainda está longe de ser.

A pressão que profissionais negros têm feito em busca de espaços mais diversos no mercado de trabalho é um caminho sem volta. Um outro debate que tem ganhado espaço é a responsabilização dos brancos pelo racismo. Como você acredita que isso pode ser feito, tirando de nós uma culpa que nunca foi nossa?

Isso é fundamental, essa conversa precisa atingir e responsabilizar pessoas brancas. E digo responsabilizar, porque a partir deste momento você entende falhas e pode recalcular a rota, repensar falas e atitudes, se questionar o porquê das coisas.

Eu acredito que as pessoas brancas precisam estudar, conversar com as pessoas pretas, entender diferentes realidades e vivências. Quando você tem empatia com o próximo (e eu odeio essa palavra) e se importa em saber sobre outros contextos e vivências, você consegue se sensibilizar e fazer algo para ajudar, mesmo que em uma pequena escala.

A mudança vem de nós e é gradativa, leva tempo, precisa de investimento, seja financeiro ou de tempo, espaço. Não tem mágica e é constante. O racismo não vai simplesmente sumir se a gente não falar dele ou ignorar que existe. A prova viva é de que já tentaram fazer isso e não funcionou.

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